O E-Social e o hábito do brasileiro de deixar para a última hora

Autor do artigo: Dr. Giordano Adjuto Teixeira

Infelizmente o Brasil é conhecido por usar sempre o “jeitinho” e de deixar as coisas para a última hora. O ditado: “Porque fazer hoje se posso fazer amanhã?”, não terá mais espaço nesse mundo pós-moderno.

As coisas estão mudando, e esperamos que para melhor, e os hábitos arraigados na nossa cultura precisam ser revistos urgentemente, caso contrário, perderemos o trem da história novamente.

O empresário tem ouvido insistentemente que o eSocial será implantado e as relações entre patrão, empregado e governo sofrerão uma mudança brutal.

Mas o que vem a ser o eSocial? Na prática, a sistemática é um grande “meio” de abastecer eletronicamente os órgãos da administração pública com dados (mensagem) dos trabalhadores, com ou sem vínculo empregatício, bem como os eventos ocorridos com eles.

O eSocial não criará novas leis. Seu objetivo é consolidá-las digitalmente por meio de um sistema informatizado. Ele também não será o agente de mudanças que suportará a transição do Brasil industrial para a sociedade do conhecimento.

Na prática, a sistemática é um grande “meio” de abastecer eletronicamente os órgãos da administração pública com dados (mensagem) dos trabalhadores, com ou sem vínculo empregatício, bem como os eventos ocorridos com eles.

Agora, as perguntas que não querem calar: a sua empresa está preparada para a o eSocial, e quais departamentos serão impactados?

Admissões, exames médicos, alterações contratuais, pagamentos, férias, rescisões são apenas alguns exemplos dos mais de 40 tipos de eventos que serão registrados por este complexo sistema, que poderá ser acessado por Receita Federal, Ministério do Trabalho, Caixa Econômica Federal, INSS e Ministério da Previdência. Os trabalhadores também poderão consultar o histórico de sua vida digital. E, no futuro, espera-se que até mesmo a Justiça do Trabalho utilizará tais registros em seus processos.

O eSocial é o maior projeto vinculado ao Sistema Público de Escrituração Digital (SPED), pois abrange cerca de 12 milhões de empregadores, 37 milhões de empregados com carteira assinada, 7 milhões de funcionários públicos, 6,5 milhões de empregados domésticos e 19 milhões de autônomos, dentre outros.

Então, sua empresa está preparada para cumprir a legislação integralmente, observando os prazos definidos em lei? Todas as informações dos empregados e prestadores de serviço estão atualizadas e registradas na ficha do empregado? Há sistemas de gestão de processos, contratos, segurança do trabalho etc.? E, mais: como está a comunicação da empresa entre os setores envolvidos no novo sistema, tais como RH, financeiro, compras, contabilidade e jurídico?

Sim, todos eles estarão obrigados a prestar as mais diversas informações sobre as relações de trabalho desenvolvidas na empresa e qualquer falha na comunicação pode custar caro. Portanto, está na hora de mudar a cultura na administração das pessoas da empresa.

Com o eSocial, não haverá jeitinho e deixar para a última hora poderá ser pior ainda. A transmissão de informações erradas ou até a sua falta poderá atrair a fiscalização para sua empresa. E quando ela chegar, não precisará mais procurar. Ela já sabe o que irá encontrar.

O eSocial não exige apenas uma adequação tecnológica, mas sobretudo uma mudança cultural. E essa nova postura levará tempo para ser assimilada pelas áreas de gestão de pessoas, contábeis, jurídica e demais envolvidas na prestação dessas informações. Não será um processo rápido, já que por tantas décadas as obrigações foram entregues posteriormente ao seu acontecimento, e com o eSocial algumas informações deverão ser enviadas com antecedência.

Nesse contexto, o papel do RH é fundamental para que a transformação cultural aconteça com o menor impacto possível. Como a área de gestão de pessoas é a maior impactada, ela exerce papel fundamental na indicação das melhores soluções e ferramentas para atender as demandas decorrentes do eSocial e também na preparação de seus colaboradores para lidar com essa nova realidade. De fato, o eSocial exige que o RH seja verdadeiramente estratégico, ou seja, antecipe-se aos fatos que impactarão nos negócios e nos resultados da empresa.

E como preparar o RH para enfrentar tais mudanças? Qualificação. Essa é a palavra que deverá ser absorvida pelos empresários. Qualificação, pois com o treinamento de seus colaboradores, os impactos que o eSocial trará serão melhor absorvidos.

Independentemente do eSocial, é preciso que as empresas se conscientizem quanto à necessidade de correção das informações. Os sistemas têm que ser abastecidos com dados corretos e confiáveis. Se houver vários sistemas, é preciso que exista integração entre eles. Sem isso, toda a parte regulatória da empresa está em risco.

Com essa lição de casa feita, o real ponto-crítico do eSocial, o que de fato muda, está no que se chama mensageria, que é a transmissão segura das informações consolidadas ao Fisco.

É sobretudo no que se refere a esse envio de informações que a empresas devem prestar atenção, pois é a partir dessa transmissão que o Fisco vai ou não validar os dados. Em resumo, o eSocial está intimamente ligado ao envio das informações e não aos impostos em si.

E a sua empresa está preparada mesmo? Possui uma política de Gestão de Riscos Trabalhistas?

Estima-se que existam 9 milhões de empresas legalmente constituídas no Brasil. Em cada um dos últimos anos, entre 250 e 300 mil sofreram fiscalizações pelo Ministério do Trabalho.  Todavia, com a implantação do Sistema de Fiscalização Eletrônica – que informatizou o processo de inspeção e potencializou a atuação dos Auditores Fiscal através da disponibilização de ferramenta web e do cruzamento e verificação de dados digitais -, e início da vigência do eSocial, a abrangência da fiscalização será praticamente total.

Conforme dados históricos do Tribunal Superior do Trabalho (TST), mais de 1,5 milhão de processos trabalhistas são autuados a cada ano. Em 2015, essa quantidade superou o pico de 2 milhões de novas ações, sendo que mais de R$ 14,4 bilhões foram pagos aos reclamantes através de condenações e acordos.

Porém, espera-se também que com a entrada do eSocial, o número de reclamatórias trabalhistas caiam em 70%. A razão? As empresas serão autuadas na tela e restará para ser discutido no judiciário questões que não envolvam recolhimento de tributos e verbas.

Fica evidente, portanto, a necessidade da adoção de medidas preventivas e corretivas que assegurem o cumprimento da legislação laboral, previdenciária e de saúde e segurança do trabalho (compliance) e, com isto, mitigar os riscos de condenações judiciais e aplicação de multas administrativas pela Auditoria Fiscal do Trabalho.

Por tudo isso, é primordial que todo empregador tenha um processo estabelecido para a gestão de riscos trabalhistas, que (1) identifique os potenciais riscos de violação da complexa legislação laboral, previdenciária e de saúde e segurança do trabalho, (2) analise e classifique as ameaças conforme o potencial de geração de passivo e, finalmente, (3) aplique o tratamento adequado à mitigação dos riscos.

São etapas do processo de Gestão de Riscos Trabalhistas:

Diagnóstico – apuração das não conformidades legais, identificando falhas, erros ou desvios de conduta (duediligence);

Análise – classificação das ameaças, conforme o grau potencial de probabilidade e de impacto do passivo trabalhista;

Tratamento – mitigação dos riscos através do mapeamento e controle das rotinas trabalhistas, com foco na otimização e melhoria dos processos (Business Process Management), e qualificação dos profissionais de Pessoal e Recursos Humanos, ajustando as práticas à legislação (compliance).

Portanto, é preciso que o empresário brasileiro se conscientize que as coisas estão mudando, que uma nova forma de gerir sua empresa se faz necessário. Caso contrário a existência da empresa fica impraticável.